Vozes que rompem barreiras: a presença feminina no rap amapaense
- AGCom

- 1 de nov.
- 4 min de leitura
Uma nova geração de artistas chega aos palcos e mostra que o talento não têm gênero
Por Bruno Monteiro e Gabriela Vasconcelos*

O rap surgiu na década de 1970, nos bairros periféricos de Nova York, nos Estados Unidos, como parte da cultura hip-hop. Apareceu como ferramenta de denúncia, dando voz a jovens negros e latinos que viviam à margem da sociedade norte-americana. As mulheres estavam presentes desde o início, mas enfrentavam barreiras de reconhecimento.
No Brasil, o rap ganhou força entre os anos 1980 e 1990, impulsionado pelo crescimento da cultura hip-hop nas periferias de São Paulo. A participação feminina era rara, mas marcante. Sharylaine é considerada a primeira mulher a gravar um disco de rap no país.

Já Nega Gizza, no Rio de Janeiro, tornou-se referência ao unir militância e rimas, chegando a organizar o Quilombo do Rap, projeto cultural para jovens da periferia. Essas pioneiras abriram o caminho para que outras mulheres ganhassem representatividade em um ambiente marcado pelo sexismo.
Apesar das conquistas, as cantoras ainda enfrentam preconceito e desproporção numérica. Um levantamento feito em 2022 pela Universidade da Califórnia mostrou que, entre as músicas de rap mais tocadas no mundo, menos de 15% têm participação feminina.
No Brasil, dados do Relatório Mulheres na Música, de2023, revelam que apenas 20% dos artistas cadastrados em festivais de rap e hip-hop são mulheres. O reconhecimento, muitas vezes, só vem após anos de insistência.
No Amapá, o hip-hop ganhou visibilidade com iniciativas que misturam competição e formação cultural. Em 2023, o 28º Encontro dos Tambores, evento que celebra a ancestralidade afro-brasileira em Macapá no mês de novembro, homenageou os 50 anos do hip-hop com batalhas de MCs, duelos de dança e premiações.
Já em 2024, o projeto Evolução das Ruas levou oficinas de rap, batalhas de rima e break dance a escolas e bairros de Macapá.
As mulheres no rap amapaense
No cenário local, já existem nomes conhecidos. Yanna MC, além de compositora de rap, é dançarina e pedagoga. A artista diz ter se inspirado em grupos como Sabotagem e Racionais MCs. No disco Dose de Igualdade, lançado em 2019, a cantora traz letras que falam sobre sexismo, misoginia e independência feminina.
Título: Olhos de Onça & Intro Nova Era
Yanna também idealizou o Urban Movement, projeto que leva oficinas de hip-hop, break dance e grafite para escolas públicas de Macapá. MC Deeh é outra rapper amapaense. A artista iniciou no break dance e hoje desenvolve o estilo Trap Funk, que mescla rap e funk. Na parceria com MC Ruth Clarke, do estado do Pará, Deeh lançou o single Black Money.
Título: Bandida Braba
Em entrevista ao projeto Legado Negro, Brukka, integrante do grupo Natural Rap, falou da carreira e da presença feminina no rap amapaense.

Legado Negro: Como e quando você descobriu o rap como forma de expressão?
Brukka: Conheci o rap através de uma pessoa num momento muito vulnerável. Havia saído de um relacionamento de 22 anos e estava há um ano deprimida. Fui conhecendo as letras e descobri que tinha uma conexão, um talento. Com a ajuda dessa pessoa, resolvi colocar para fora, nas letras, tudo aquilo que eu estava passando. O rap entrou na minha vida em um momento bem complicado e me deu forças, ele salva vidas!
Quais são suas principais influências?
Não tem como não escutar a Laura Gigri e admiro demais o trabalho do Emicida, são minhas principais influências! Aqui no Amapá, o CRGV (Clã Revolucionário Guerrilha Verbal) é uma grande influência para mim também. Uma dos motivos de eu cantar rap foi porque era do CRGV. O Poca me falou em 2023 que eu tinha potencial e que o rap feminino precisava de mulheres presentes.
Que obstáculos você enfrentou para conquistar espaço e reconhecimento?
O maior até agora foi eu mesma. Tinha muito medo e vergonha, ficava me escondendo atrás dos demais integrantes do grupo. Mas quando entendi que era esse meu chamado, consegui superar esse medo.
Até aqui, qual o momento mais marcante da sua trajetória?
Foi em 2024, em um evento do Dia da Consciência Negra, na União dos Negros do Amapá. Foi um show lindo, perfeito! Consegui cantar várias músicas que eu compus, foi marcante.
Qual das suas músicas tem mais significado para você?
Ela se chama Minha Cor. Nela, eu retrato tudo o que já vivi na minha vida. Meu tratamento contra a depressão e a ansiedade, por exemplo. De cinco em cinco minutos, eu tinha que tomar remédio para fazer parar a vontade de cometer suicídio. Mas também falo das pessoas ao meu redor que me tiraram do “mundo cinza” e me trouxeram para o “mundo colorido” delas, o qual hoje eu chamo de família.
Como você imagina o futuro do rap brasileiro e o seu papel dentro dele?
O futuro é de expansão e profissionalização. Quero mostrar que a gente não está brincando, que temos voz para exibir a que viemos, que temos potência, que podemos quebrar paradigmas. Quero mostrar também que o rap me aproximou de pessoas que me tiraram do fundo do poço. O hip-hop salva vidas, eu sou a prova disso! A minha vida foi transformada e hoje consigo cantar para as pessoas o que aconteceu comigo e como consegui mudar minha história.
*Reportagem produzida na disciplina “Laboratório de Jornalismo e Convergência”, ministrada pela professora Esp. Aline Ferreira.



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