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EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO 2020 EXPÕE AS DESIGUALDADES EDUCACIONAIS

Por Hendrew Rodrigues


Desde o dia 31 de Dezembro, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou sobre o surgimento do Coronavírus, muitos países tomaram medidas de isolamento social rígidas para que pudesse ser achatada a curva de transmissão do Covid-19. No Brasil, a tentativa de achatar a curva apontou maio com números menores, no entanto, o país está acometido por intensos conflitos políticos a respeito das medidas, o Presidente da República e seguidores ridicularizam o vírus, e, além disso, a população não tem respeitado o isolamento e distanciamento, permanecendo nas ruas e levando governadores a medidas mais restritivas com penalidades. Oficialmente, o Brasil tem 257.396 casos confirmados e 16.941 mortes, hoje, dia 19 de maio. Nesse cenário, o Ministério da Educação mantem o ENEM e anunciou as inscrições até 22 de maio e a realização das provas em novembro.


Nas atuais circunstâncias da pandemia do novo coronavírus, praticamente todas as escolas do país estão fechadas. As escolas particulares têm feito maiores esforços para manter o funcionamento com ensino à distância, enquanto as escolas públicas avaliam e buscam planejamentos possíveis. Entre as que conseguem atuar, certamente o acesso a internet e a aquisição de estrutura material para isto são barreiras no processo. Em casa, processos de produção de estudo, concentração e acompanhamento de conteúdos virtuais acontecem de maneira muito diferente entre famílias com estabilidade financeira e famílias em meio à crise econômica, afetadas na linha da frente. Os auxílios emergenciais do governo não darão conta de subsidiar a estrutura e a estabilidade, apenas dão conta da sobrevivência em tempo de pandemia.


Os dados do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC) indicam o acesso a computadores e internet nos domicílios brasileiros. Condições mínimas para estudar em tempo de isolamento social. A desigualdade econômica reflete diretamente na desigualdade social que, consequentemente, refletirá na desigualdade educacional, de modo que nem todos possuem as mesmas oportunidades para educação continuidade e realização de provas, mesmo em novembro. Desta forma, muitos estudantes serão injustiçados pelo déficit de aprendizagem, que sofrerão com a perda desse primeiro semestre de 2020.


Fonte: CGI.br/NIC.br, Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), Pesquisa sobre o Uso das Tecnologias de Informação e Comunicação nos Domicílios Brasileiros – TIC Domicílios 2018.


Por esses problemas de desigualdades educacionais, muitos estudantes se revoltaram na internet, pois muitos só conseguem ter o aparato educacional nas instituições de ensino, que estão fechadas. Sendo assim, uma prova nessas circunstâncias poderia afetar completamente o desempenho daqueles que só tem a escola para tirar dúvidas e focar nos assuntos.


Mas, segundo o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, em uma entrevista à Jovem Pan de São Paulo realizada no dia 14 de abril, afirmou que “O objetivo do Enem é selecionar as pessoas mais qualificadas e mais inteligentes”. Porém, quem ele considera as pessoas mais inteligentes? Quem são os mais qualificados? Os que podem pagar pelo ensino? Os que possuem rendas financeiras para manter a tecnologia em casa? Os que podem pagar por wifi residencial e professores particulares?


A realidade é que o Brasil é um país desigual em diversas situações sociais e econômicas. As oportunidades reduzem conforme reduz a renda individual e familiar de grupos sociais excluídos. São tiradas das pessoas que devem dividir seu tempo entre trabalho e estudo. Tais impactos recaem, majoritariamente, sobre os mais pobres, negros e periféricos.


Os índices da taxa de escolaridade dos alunos de todo o Brasil, entre 15 e 17 anos, que são a idade em que os alunos estão começando ou saindo do Ensino Médio e entrando para o Ensino Superior, mostram déficit mesmo com a melhora em comparação do Ano de 2017 para 2018.


Como os dados mostram, houve um crescimento significativo na taxa de escolaridade em todo país, mas a taxa de frequência em relação à cor e raça aponta diferença considerável. Enquanto brancos possuem 76,5%, os pretos e pardos estão com 64,9%. Considere ainda que as políticas públicas afirmativas de ingresso escolar de pessoas pretas e pardas no sistema escolar existem não há muitos anos, e tem sido alvo de muitas críticas. Esses números poderiam ser ainda mais baixos, se não fossem essas lutas sociais. A contínua baixa frequência de alunos pretos ou pardos nas escolas pode ainda ser identificada pela falta de garantia de políticas públicas que auxiliem as gerações da infância e juventude destas famílias a se dedicar exclusivamente para os estudos, ter materiais didáticos para irem à escola e não precisarem abandonar as escolas por processos de preconceito racial ou necessidades de ajudar as famílias com a renda do grupo.


Ainda seguindo os dados do IBGE, a taxa de escolaridade entre jovens de 18 a 29 anos, etapa na qual já estão ingressando em uma instituição de ensino superior, os índices são preocupantes. Nos dados de 2018, as pessoas entre 18 e 24 anos, independente do curso, foi 32,7%. Mas somente 25,2% dos jovens frequentavam cursos de educação superior ou haviam completado esse nível. Em relação à taxa de frequência líquida por cor e raça, existe um prevalecimento de pessoas brancas com 31,1% contra 18,3% das pessoas pretas ou pardas.


Esses dados indicam que de fato existe uma desigualdade educacional, na rede de ensino no país, o que faz pensar na fala do atual Ministro da Educação, onde o mesmo afirma que “o Enem não é 100% justo” e que o objetivo do Enem é “selecionar as pessoas mais qualificadas e mais inteligentes”. Realmente, o Enem não é 100% justo, pois se ele fosse justo, seria garantia a todos os estudantes oportunidades iguais e o direito de competir de forma igualitária para o acesso a uma universidade pública. Mas, como o Ministro se baseia em falácias, acaba por ignorar dados comprovatórios que mostram a desigualdade que existe nos níveis de classes sociais, no país, e que a prova do Enem 2020 possibilita mais ainda a desigualdade educacional por ser uma disputa desigual, pois favorece os que têm condições de acesso a computadores e a internet.


Para a professora de filosofia Estefani Karina, 25, o “Enem é extremamente seletivo, ele foi criado com esse intuito de fazer uma seleção de quem é mais ‘inteligente’, é uma forma errada de se administrar a educação no país, mas infelizmente o que esse exame mostra é que os mais privilegiados sempre saem na frente. Tanto é que a maioria das pessoas que estão na universidade são pessoas com boas condições financeiras” e finaliza seu ponto de vista dizendo que o “Enem vai de encontro com todos os parâmetros de desigualdade social, quando se vê que um país que tem carência de educação, alimentação e tantas coisas, fica claro que está escancarado a não importância para aqueles que não possuem condições de ter computador, internet em suas casas para tentar estudar para um exame extremamente seletivo. Mais uma vez, não se tem a preocupação em querer que todos os estudantes entrem nas universidades”.


Não adiar a prova do Enem é mostrar que o atual Governo Federal não se preocupa com a qualidade de ensino e oportunidades para todos, porque somente os mais privilegiados sairão melhor na prova, além de que o Ministério da Educação insiste em aplicar a prova anunciando datas, mas não traz quaisquer planejamentos de como poderá ser garantida a saúde dos participantes que podem contrair o Covid-19 e piorar a rede de saúde pública de seu estado e município, no dia em que todos estiverem na mesma sala para realização dos exames estudantis.

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